Por Davi de Souza (davi@petronoticias.com.br) –
O Brasil está enfrentando o seu maior desafio dos últimos anos: a luta contra o coronavírus. Mas mesmo com o foco no combate à doença, o país tem procurado caminhar em alguns assuntos na esfera econômica. É o caso da mineração de urânio, cujo o arcabouço legal está sendo revisado pelo governo para tentar propor mudanças e tornar a legislação mais atraente, permitindo criar parcerias com o setor privado. Este foi o tema da apresentação da secretária adjunta de geologia e mineração do Ministério de Minas e Energia, Lilia Mascarenhas, durante um seminário online promovido pela Associação Brasileira para Desenvolvimento das Atividades Nucleares (ABDAN). A partir dessa revisão e possível aprimoramento na legislação, a ideia é lançar um programa de parceira onde a Indústrias Nucleares do Brasil (INB) apresentaria áreas de mineração que seriam exploradas em conjunto com um agente privado.
“Nosso otimismo é que as parcerias possam se multiplicar. Nosso objetivo é trazer uma dinamização da nossa produção [de urânio]. Eu diria até que temos um primeiro esboço de programa para, já em 2021, a INB possa estar em condições de ofertar de áreas para essas parcerias. Estamos aguardando apenas a consolidação de pelo menos uma parte das questões legais para que haja uma coisa mais clara e um arcabouço que dê mais conforto ao investidor”, explicou Lilia.
O presidente da INB, Carlos Freire, foi o mediador do debate e explicou à reportagem do Petronotícias que essa oferta de áreas depende de uma evolução das questões legais. “Se não existir um arcabouço legal que dê segurança ao investidor, ele não virá. Portanto, para superar isso trabalhamos a quatro mãos com o MME, desde 2019, no sentido de se buscar essa segurança legal. De nossa parte, a INB vem procurando estruturar essas parcerias, vendo como poderão acontecer e quem seriam esses possíveis interessados”. O presidente da estatal diz ainda acreditar que terá um cenário mais claro e favorável para isso já no próximo ano.
Quando se fala nessa readequação da legislação, o Ministério de Minas e Energia já tem mapeado alguns pontos que receberão sugestões de mudanças pela pasta. “Nós temos um arcabouço jurídico que não impede a parceria. Mas ele traz alguma insegurança e não dá muita confiança ao setor. Esse arcabouço está sendo estudado como um todo”, afirmou Lilia.
O Ministério de Minas tem ao menos quatro principais pontos da legislação que serão objeto de propostas de adequações jurídicas. O primeiro é a formação de uma regulação de modelos de parcerias de empresas privadas com a INB, dando assim, segundo Lilia, “mais conforto ao investidor”. O segundo ponto seria a adequação do regime próprio para minérios nucleares. A ideia aqui é que o licenciamento e fiscalização, hoje feito através das ações da CNEN, sejam passados para a Agência Nacional de Mineração (AMN), em ação conjunta com o órgão responsável pela gestão e fiscalização dos aspectos de radioproteção.
Por fim, outras propostas de adequação são a delegação de competência para comercialização de minério de urânio para a INB e definição dos recursos de urânio que serão usados para abastecimento do Programa Nuclear Brasileiro.
“Já existem propostas de alguns instrumentos legais. Como é uma legislação que data da década de 1960, com algumas pautas sendo incorporadas pela Constituição de 1988, ele é um arcabouço legal complexo. Muito complexo. Além disso, traz umas questões com muita preservação do Estado Brasileiro que não são atrativas para o investidor. Existem pautas propostas no âmbito de grupos de trabalho com participação de todos os atores. Isso está previsto para ser dado andamento no decorrer desse ano de 2020”, completou Lilia.
Além do aspecto regulatório da mineração de urânio, o webinar da ABDAN trouxe também uma visão financeira sobre este mercado. O gestor de recursos na L2 Capital Partners, Marcelo López, disse em sua apresentação que a produção está reduzida já que as duas maiores minas do mundo não estão produzindo atualmente e que o urânio tem obtido a melhor performance entre as commodities neste ano.
Analisando o cenário mundial, López lembrou alguns fatores como o retorno da operação das usinas nucleares no Japão e a intenção do país asiático de continuar expandindo a participação da fonte em sua matriz. Ele também avaliou que a narrativa em torno da tecnologia nuclear está favorável, lembrando que figuras importantes como Bill Gates e o presidente dos EUA, Donald Trump, são entusiastas da utilização da fonte. “Na minha opinião, [o negócio nuclear] terá alta volatilidade. Veremos muitos altos e baixos, mas o risco do investimento é baixo”, afirmou.
O presidente da ABDAN, Celso Cunha, agradeceu ao final do encontro a presença dos palestrantes. O webinar reuniu cerca de 80 ouvintes. Este foi o segundo seminário virtual da série Nuclear Trade and Technology Exchange (NT2E). Na primeira edição, o convidado foi o presidente da Eletronuclear, Leonam Guimarães. Os webinars estão sendo realizados pela ABDAN em parceria com o Sebrae, em preparação da NT2E – evento previsto para abril de 2021.