As obras da usina nuclear de Angra 3 foram retomadas. Em entrevista à Sputnik Brasil, especialista em engenharia nuclear explicou por que é preciso expandir o parque de energia atômica do Brasil e por que estão dizendo que os riscos de novos desastres é assunto do passado.
A usina nuclear de Angra 3 deveria ter sido finalizada em 2019. Os problemas envolvendo a sua construção, desde 1984, foram tantos que a nova promessa do governo federal, de inauguração em fevereiro de 2028, soa fictícia. Mas, desta vez, parece que o projeto sairá do papel, pois muitos dogmas impostos à produção nuclear foram superados nas últimas décadas.
O medo de acidentes como os de Three Mile Island, Chernobyl e Fukushima faz parte do passado, garante o professor de engenharia Cláudio Geraldo Schon, da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP). Ele explicou que uma série de fatores explicam o retorno do interesse global pela energia nuclear, além dos problemas que o continente europeu enfrenta com produção de energia.
“Um evento importante que ocorreu neste ano foi a decisão da comunidade europeia de classificar a energia nuclear como verde”, disse, acrescentando que “isso trouxe uma mudança do ponto de vista do caráter ambiental“.
“Todo mundo se preocupa com os grandes acidentes, mas os novos desenhos das usinas são mais seguros. A ideia de uma usina nuclear hoje trabalha com situações chamadas passivas, em que a própria usina para de produzir radiação em caso de acidente, o que garante que não haverá contaminação do meio ambiente.”
O professor avalia que a tecnologia envolvendo pesquisas e desenvolvimento atômico está avançando e destacou que existem meios para que o próprio dejeto produzido pelas usinas passe por técnicas para se reduzir a sua radioatividade.
Além disso, explicou, países estão ingressando em um modelo novo de usinas, com reatores menores. “Os small modular reactors [reatores modulares pequenos], que são reatores menores, causam consideravelmente menos impacto ambiental, além de ter um custo menor”, afirmou.
Essa novidade é uma das explicações que reduziram o excesso de pressão da sociedade e dos ambientalistas contra a instalação de novas usinas no país. Conforme aponta o especialista, é notório que “nos últimos 20 anos a postura dos ambientalistas mais radicais mudou com relação à questão nuclear“.
“Alguns admitem que isso é uma realidade. A gente precisa reduzir produção de CO2 [dióxido de carbono]. E existem certos limites do que se pode fazer com fontes renováveis, como solar e eólica”, comentou.
Vários países lançaram programas de energia atômica ousados: a China, com 150 reatores em 15 anos; a França, com 14 reatores; a Inglaterra, com uma linha de produção de reatores modulares pequenos; e os EUA reativando sua indústria nuclear, focada em reatores pequenos e produção de hidrogênio a partir desses equipamentos, além da própria Rússia, que segue sendo uma grande liderança no setor.
As novidades e as mudanças tecnológicas na área estão promovendo um novo ciclo de investimentos em energia nuclear. No Brasil, o Plano Nacional de Energia (PNE) para 2050 já indica a geração de 8 gigawatts (GW) a 10 GW com novas usinas.
Conforme aponta o especialista, além de Angra 3, outro “grande projeto é a construção do reator de multipropósito, que será instalado no município de Iperó, em Sorocaba, em São Paulo, onde fica o centro da Marinha”.
Ele explicou que a construção do reator de multipropósito é um projeto “ousado, que pode transformar o Brasil em um país independente na produção de radiofármacos“, o que seria fundamental para dar início a uma importante indústria de medicina nuclear.
O professor da USP entende que a parte cientifica desse projeto é muito importante e alguns comparam sua importância à do Sirius, o acelerador de partículas em Campinas (SP) capaz de acelerar elétrons próximo à velocidade da luz.
“Esse reator de multipropósito brasileiro é importante porque a gente fala sempre da questão dos radiofármacos e do grande potencial social, mas de fato será um importante ponto de pesquisa nuclear no Brasil e na América Latina. O Brasil investe dinheiro comprando isso e poderia ser fornecedor mundial”, disse.
Fonte: Sputnik Brasil