Nuclear Summit: especialista exaltam potencial brasileiro para exportação de combustível nuclear

O presidente da Eletronuclear, Leonam Guimarães, e o apresentador do painel, Rodrigo Polito

O Brasil reúne todas as condições para tornar-se um importante exportador de combustível nuclear no futuro. Essa é a opinião de especialistas que participaram de um painel de debates no Nuclear Summit 2022, evento que está sendo organizado nesta semana pela Associação Brasileira para Desenvolvimento das Atividades Nucleares (ABDAN). O farto volume de recursos de urânio do país e o domínio da tecnologia de enriquecimento são alguns dos carimbos no passaporte do Brasil para um futuro no qual poderá fornecer combustível nuclear para as demais nações. Essa perspectiva tem como pano de fundo o recente reencontro de diversos países com essa fonte de produção de energia. Governos em diferentes continentes anunciaram, no último ano, novos planos de construção de plantas de geração nucleoelétrica. Para a CEO do Nuclear Energy Institute (NEI), Maria Korsnick, esse movimento internacional exigirá um maior fornecimento de combustível.

O Brasil é abençoado nesse sentido com suas reservas de urânio e também tem um mercado para enriquecimento de urânio. Olhando para o futuro, se ouvirmos as tendências do mercado, até o final desta década e até na próxima, haverá um aumento significativo da demanda por urânio enriquecido. Com os acontecimentos atuais entre a Ucrânia e a Rússia, muitos países vão querer sair da matriz russa. Isso é uma oportunidade para o Brasil preencher essa lacuna”, declarou Maria.

O presidente da Eletronuclear, Leonam Guimarães, compartilha do mesmo entendimento. Para ele, a expansão da participação da nuclear nas matrizes energéticas no exterior dá ao Brasil a oportunidade de ampliar sua capacidade industrial nas etapas que ainda precisam de impulso – produção de concentrado, conversão e enriquecimento. Hoje, a estatal Indústrias Nucleares do Brasil (INB) consegue atender cerca de 65% da demanda das recargas anuais de Angra 1. Quando estiver completo o desenvolvimento da Usina Comercial de Enriquecimento de Urânio, em Resende (RJ), a INB poderá atender à demanda das usinas Angra 1 e 2 e da futura usina Angra 3. O cronograma inicial prevê que a conclusão dessa usina deve acontecer só em 2037, mas a INB já declarou que trabalha com a Marinha para adiantar esse calendário.

Além do atendimento do mercado interno, o Brasil precisa pensar também no mercado internacional e na possibilidade de participar como exportador de concentrado de urânio, hexafluoreto de urânio natural ou hexafluoreto de urânio enriquecido. É uma oportunidade muito ampla que se abre no médio e longo prazos para o Brasil”, projetou Guimarães. O presidente da Eletronuclear destacou ainda a expansão de novas tecnologias de reatores. Segundo o executivo, olhando para os  pequenos reatores modulares (SMRs), praticamente todos os projetos usam o chamado urânio HALEU (que é enriquecido entre 5% e 20%). As grandes usinas atuais, por sua vez, usam urânio enriquecido entre 3% e 5%.

Isso abre um novo mercado que, até então, era um nicho muito pequeno, atendendo apenas reatores de pesquisa. Abre-se assim uma perspectiva de oportunidade para o Brasil, tendo em vista que o país já domina a tecnologia de enriquecimento e já produziu o HALEU para o reator IEA-R1 do IPEN”, afirmou.

OS DESAFIOS E AS VANTAGENS DA FONTE NUCLEAR NO PLANEJAMENTO ENERGÉTICO BRASILEIRO

Outra participante do painel de debates foi a diretora-geral da World Nuclear Association (WNA), Sama Bilbao y León, que avaliou positivamente a forma como o Brasil tem tratado a questão nuclear nos últimos anos. A especialista, inclusive, acredita que o país pode ajudar a incentivar outras nações a investirem na tecnologia. “O que eu diria é que à medida que os projetos nacionais desenvolvem as capacidades locais, acho que o Brasil pode tornar-se um exemplo para os demais países, caso todos os empreendimentos nucleares sejam lançados a tempo. A indústria nuclear brasileira será capaz de contribuir e apoiar países que estão querendo começar ou acelerar a implantação de usinas”, projetou.

Enquanto isso, o professor do Programa de Planejamento Energético da Coppe/UFRJ, Maurício Tolmasquim, ressaltou algumas das vantagens da geração nuclear, como o fato de a tecnologia não emitir gases do efeito estufa, ao contrário das outras fontes de base. “Além disso, existem outros fatores positivos, como a questão do uso de terra. Uma instalação nuclear típica ocupa pouco mais de 1 km². A fonte nuclear é confiável, funcionando sem interrupção por quase um ano. Além disso, o Brasil domina o enriquecimento de urânio”, frisou.

Tolmasquim, que já foi presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), apontou também alguns desafios que precisam ser superados. Para ele, a questão da gestão dos resíduos e os custos elevados são pontos que pesam negativamente na hora do planejador decidir pela construção de usinas nucleares. Por fim, o pesquisador lembrou ainda dos atrasos que historicamente têm afetado as obras das plantas nucleares brasileiras.

Eu sei que isso não é uma culpa dos gestores. O setor nuclear tem gestores competentes de altíssimo nível. Mas o próprio modelo institucional de empresas públicas tem levado, historicamente, a esses atrasos. Isso é uma questão que tem que ser levada em conta”, apontou. “Nenhum planejador pode ter qualquer preconceito com determinada fonte. Planejador não pode, de início, falar ‘essa fonte não’. Ele tem que analisar cada uma das fontes e escolher o portfólio mais interessante”, acrescentou.

Fazendo um contraponto às falas de Tolmasquim, o diretor de engenharia da Chesf, Reive Barros, lembrou que a questão dos custos elevados só será resolvida quando for dada escala à fonte nuclear – isto é, quando mais plantas forem construídas no Brasil. Barros ressaltou ainda que as plantas nacionais de geração nucleoelétrica têm um dilema – o modelo de negócio.

Todas as demais fontes se desenvolveram porque foram criadas oportunidades que permitiram a participação da iniciativa privada. E, a partir disso, você passa a ter maior competição. Aqueles modelos nos quais o governo ficou com a posição central, evidentemente, têm os problemas que estamos vivenciando. Essa questão institucional do setor está sendo tratada e, portanto, chegaremos a colocar a nuclear no mesmo patamar de condições de negócios das demais fontes”, analisou.

Ontem (25), como noticiamos, durante o Nuclear Summit, o Ministério de Minas e Energia declarou que a construção de reatores para geração elétrica com a participação da iniciativa privada é um assunto que pode ser consolidado como uma diretriz do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE).

Fonte: Petronotícias