O combustível nuclear usado tem sido gerenciado com segurança desde primórdios da indústria nuclear nas décadas de 1950-60. Países e organizações que estão considerando a possibilidade de construir novas usinas nucleares devem incluir a avaliação dos requisitos de gerenciamento de combustível usado. Essa avaliação leva em consideração o conhecimento e as soluções existentes, bem como os desenvolvimentos em andamento e pesquisas inovadoras nessa área.
Situação atual
Historicamente, duas rotas básicos para o gerenciamento do combustível nuclear usado foram implementados por governos e indústrias. São elas:
· Reprocessamento e reciclagem para fazer combustível novo, com acondicionamento dos resíduos de alto nível de atividade resultantes sendo futuramente colocados em uma instalação de deposição final geológica profunda.
· Armazenamento provisório no sítio da usina nuclear ou em uma instalação de armazenamento externa, aguardando futura disposição final ou reprocessamento.
Além disso, uma outra prática limitada a reatores de pesquisa é a devolução do combustível irradiado ao país de origem para reprocessamento ou acondicionamento para disposição final.
Os resíduos de alto nível devem ser acondicionados de modo que estejam em uma forma adequada para seu posterior gerenciamento, transporte, armazenamento e disposição final em uma instalação geológica profunda. O combustível irradiado destinado ao descarte será colocado em recipientes especialmente projetados; os resíduos separados do reprocessamento são vitrificados e selados em contêineres de aço inoxidável. Embora o descarte final de combustível irradiado ou resíduos de alto nível do reprocessamento ainda não tenha sido implementado, atividades de licenciamento e construção estão em andamento em vários países para apoiar isso.
Muitos países, como os EUA, França, Reino Unido, Rússia, China, Japão, Índia e Alemanha, tiveram ou ainda têm instalações de reprocessamento de combustível nuclear irradiado comercial. A unidade de La Hague, na França, atende às suas necessidades domésticas de reprocessamento e oferece serviços de reprocessamento para outros países (esses serviços foram usados pelo Japão, Bélgica, Itália, Holanda e Alemanha). O Reino Unido também realizou o reprocessamento de combustível nuclear irradiado nacional e estrangeiro em Sellafield, mas parou a operação de todas as atividades de reprocessamento em 2022. Os EUA construíram uma instalação comercial que operou por 10 anos e duas outras que foram construídas, mas nunca operaram. Decisões políticas determinaram que os EUA não reprocessariam combustível irradiado, e passariam para o descarte direto. No Japão, uma usina de reprocessamento foi construída em Rokkasho, mas, em parte devido a novos regulamentos de segurança após o acidente de março de 2011 em Fukushima, ainda não começou a operar. Os produtos reciclados resultantes do reprocessamento de combustível irradiado são urânio e plutônio, sendo este último utilizado na fabricação de combustível de óxido misto (MOX, sigla em Inglês). Fluxos de resíduos de alto nível separados durante o reprocessamento de combustível irradiado requerem descarte final, mas os volumes de resíduos são minimizados em comparação com o descarte direto de combustível irradiado, amenizando assim alguns requisitos para o projeto e operação do repositório geológico.
O custo de reprocessamento e reciclagem pode ser considerado relativamente alto em comparação com os custos históricos do urânio extraído, mas isso pode mudar dependendo do nível de demanda por combustível nuclear no futuro. Isso, juntamente com considerações sociais, de sustentabilidade e segurança de abastecimento, combinadas com o desenvolvimento de soluções inovadoras, pode levar o reprocessamento a se tornar a opção mais atraente para o gerenciamento de combustível irradiado.
Alguns países, como os EUA, Suécia, Finlândia, Espanha, Suíça e Canadá, decidiram descartar diretamente seu combustível irradiado. Em alguns casos, esta é uma decisão política, mas em outros foi considerada econômica considerando as condições atuais do mercado.
Repositórios subterrâneos projetados estão avançando para a operação em alguns países e a tecnologia é bem compreendida e desenvolvida. Muitas geologias são adequadas para descarte geológico final de combustível irradiado ou de resíduos vitrificados de alto nível resultantes do reprocessamento. No entanto, encontrar um local politicamente aceitável pode ser difícil, mas a Finlândia, a Suécia e a França conseguiram. Nos EUA, a instalação de descarte geológico profunda para resíduos transurânicos relacionados à defesa, a Usina Piloto para Isolamento de Resíduos (WIPP, na sigla em Inglês), está em operação desde 1999 no Novo México. Planos de outros países para uma instalação de descarte geológico estão menos avançados, principalmente devido a razões políticas.
Antes da construção dos primeiros reatores nucleares comerciais, havia várias centenas de reatores de pesquisa e de teste em mais de 60 países. Estes foram projetados e construídos por vários países, incluindo EUA, ex-União Soviética, França, Reino Unido, Canadá e, posteriormente, China para destacar suas tecnologias para serem usadas por outras nações. O compartilhamento de tecnologias nucleares fazia parte da visão do programa Átomos para a Paz. Por meio desses acordos governamentais, o combustível era alugado e posteriormente vendido aos proprietários dos reatores, muitos dos quais eram institutos ou universidades nacionais. Os EUA, a União Soviética e a China implementaram um programa de devolução de combustível.
Possíveis opções futuras
· Opções avançadas de reciclagem, como a multirreciclagem em reatores convencionais a água leve ou a transição para ciclos de combustível fechados que utilizam totalmente os recursos naturais de urânio enquanto minimizam as quantidades de resíduos e os requisitos para descarte geológico. Opções avançadas adicionais, como a transmutação de actinídeos menores, estão surgindo, embora essas tecnologias exijam esforços de desenvolvimento significativos para alcançar a comercialização.
· Descarte em poços profundos. Essas tecnologias exigem esforços significativos de pesquisa e desenvolvimento para atingir a maturidade.
· Repositórios internacionais/regionais, especialmente para países com programas nucleares pequenos. Isso também requer um desenvolvimento significativo, bem como acordos intergovernamentais de longo prazo.
· O esquema de devolução de combustível irradiado atualmente implantado para reatores de pesquisa pode ser adaptado para maiores quantidades de combustível irradiado provenientes de atividades comerciais, com infraestrutura compartilhada de reprocessamento/reciclagem e descarte. Isso exigiria o desenvolvimento de termos comerciais inovadores entre a indústria do ciclo do combustível nuclear, fornecedores de reatores e usuários de usinas de energia.
· Os usuários de energia nuclear não possuírem o combustível poderia ser um caminho potencialmente mais ambicioso e de prazo mais longo. O combustível poderia ser alugado por um fornecedor ou apenas a energia contida no combustível poderia ser comprada, sendo o combustível irradiado devolvido ao fornecedor. Esse esquema também poderia incentivar os fornecedores de combustível a otimizar o uso dos recursos de urânio por meio da reciclagem. No entanto, além da necessidade de implantar arranjos comerciais inovadores, isso exigirá acordos de longo prazo a nível intergovernamental para tratar da segurança do combustível em aspectos de abastecimento. Há também implicações regulatórias quanto a permitir que resíduos gerados em um país sejam descartados em outro país.
O desenvolvimento de reatores pequenos e avançados para fornecer energia para calor de processo, dessalinização, indústrias remotas como mineração e possíveis outras finalidades não elétricas também exigirão soluções inovadoras de gerenciamento de combustível irradiado.
Atualmente existem soluções para o gerenciamento sustentável de combustível nuclear irradiado, e a indústria nuclear continua a desenvolver opções inovadoras para o futuro. Essas opções atuais e futuras para o gerenciamento de combustível irradiado devem ser incluídas como parte do processo de avaliação de possíveis novos projetos nucleares.
Fonte: LinkedIn