Mesmo com um grande avanço no Programa Nuclear Brasileiro, ABDAN acredita em momento de transição com o novo governo

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Projeto Perspectivas 2023 desta terça-feira fala da importância do desenvolvimento do setor nuclear brasileiro. Convidamos o Presidente da ABDAN – Associação Brasileira para Desenvolvimento das Atividades Nucleares – Celso Cunha, para falar sobre o crescimento do uso da energia nuclear no Brasil, justamente em um momento importante de transição de governo. Um momento tão importante como delicado. A ABDAN assumiu um papel no Brasil que a colocou na vanguarda do desenvolvimento nuclear, reunindo os interesses fundamentais do setor, seja na geração de energia, seja no uso da medicina ou mesmo na radiação de alimentos. O seu papel de estreitar a relação com o governo central, no Gabinete de Segurança da Presidência (GSI), foi fundamental para costurar todas as engrenagens para que as empresas que compõem a associação tenham as devidas respostas e apoio aos seus anseios. Neste momento de transição, o presidente da ABDAN não esconde uma preocupação com o que a de vir, embora tenha boas perspectivas para o mundo nuclear em todo o globo. Vamos saber, então, como Cunha está vendo todas estas mudanças.

– A eleição de um novo governo é motivo de preocupação do setor nuclear?

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– Nossa expectativa para o próximo governo deixa alguma preocupação na transição do setor nuclear, sobre o que pode acontecer.  O país vai passar por um momento de transição muito forte. O Brasil todo vai passar por um momento de transição forte, os comandos de várias instituições públicas deverão ser trocados e isso, sem sombra de dúvidas, tem consequências e vai gerar delay na execução de projetos, na execução de obras e na execução de muita coisa que vinha sendo construída, inclusive na questão do Marco Legal do setor. O setor ainda vive amarras muita antigas. Amarras da década de 50, 60 e 70 que precisam ser modernizadas. Por isso, olhamos para o próximo período, o próximo ano principalmente, com muita preocupação.

– Quais são as perspectivas?

Sítio Nuclear para Angra 4

Sítio Nuclear para Angra 4

– A ABDAN vem discutindo e trabalhando no sentido de apoiar as decisões, dar subsídios às decisões que vinham sendo feitas, mas de qualquer maneira é preocupante. Por outro lado, no mundo, o setor nuclear está avançando. Os países com seus setores nucleares vão avançando. Novas usinas sendo construídas, antigas usinas sendo modernizadas. Tem muita coisa acontecendo. Importante lembrar, por exemplo, do programa da China que prevê construir 150 reatores. O programa da França prevê construir mais 14 reatores. As linhas na Inglaterra e outros países europeus estão avançando. Novas tecnologias. Comparado ao Brasil, tudo isso é preocupante.

– Houve algum avanço formal em 2022?

– Neste momento, acabamos de ter um pequeno avanço, que foi a aprovação na Câmara de Deputados, do Projeto de Lei 1133, que permite a flexibilização do monopólio da extração do Urânio. O Urânio vai continuar sobre a guarda da INB, só ela pode vender, só ela pode manusear, mas vai ter um parceiro para poder extrair esse material. Então, essa decisão foi uma grande vitória.

Construção de um SMR

Construção de um SMR

A nossa expectativa no próximo ano é de sinal amarelo. Um sinal de cautela e de muito trabalho. Porque vamos ter que explicar o que é o setor nuclear para todos esses novos governantes e demonstrar a importância disso.

– Qual a perspectiva para o mercado de pequenos reatores modulares?

 Em termos de perspectiva do mercado de SMRs para o Brasil, a ABDA, as empresas associadas e alguns membros e entidades do Brasil e de fora do Brasil, estão trabalhando em conjunto com um Fórum de SMR e tem a perspectiva de, em 2023, ver a EPE lançar um caderno com tudo o que foi aprendido e colocado. Também estaremos entregando agora, no início do ano, um planejamento proposto pela ABDAN realizado em conjunto com a UFRJ para a introdução do SMR no Brasil.

Transporte de um SMR

Transporte de um SMR

Eu acredito que 2023 será um ano de solidificar essas diretrizes para que em 2024 possamos colher o fruto de começarmos a trabalhar os SMRs efetivamente.

Uma coisa importante que surgiu aqui, no nosso evento do Nuclear Legacy, foi o fato da Holtec ter assinado um acordo com a INB no sentido de produzir combustível para o seu SMR. Outras empresas vêm oferecendo propostas de trabalho conjunto. Não só de produzir o seu combustível na INB, mas também de produzir parte ou integralmente de SMR na Nuclep, através de parceria público-privada. Isso é uma sinalização de um bom caminho de SMR no Brasil.

É importante dizer que o SMR tem uma série de vantagens. Isto é, o menor risco financeiro, o menor risco de empreendimento, a produção de hidrogênio, a possibilidade de dessalinização de água… Enfim, existe um conjunto de atributos que são muito interessantes. Um deles é, por exemplo, dependendo do tipo de SMR, você pode colocá-lo no meio da Amazônia para alimentar determinadas áreas e só voltar dez anos depois para colocar combustível.

Reator Multipropósito

Reator Multipropósito

Isso tem um valor inestimável. Sem construir linhas de transmissão, desmatando, isso pode trazer um benefício enorme. Podemos colocar um SMR em cima de uma barcaça, levar para regiões remotas para produzir energia. A tecnologia de SMR pode ajudar no Nordeste do Brasil – as eólicas e as solares possuem grande variação de geração, pelas próprias características da fonte. É possível colocar um SMR para estabilizar o sistema na região, o que permite crescer mais ainda com as renováveis. É o futuro que está aí pela frente. Acreditamos que em 2023 será possível solidificar todas as informações sobre as potencialidades do SMR no Brasil.

– Como está o mercado da medicina nuclear? Quais as perspectivas?

Projeto onde ficará o RMB

Projeto onde ficará o RMB

– Nesse setor, a nossa maior perspectiva é fazer com que o Reator Multipropósito (RMB) saia do papel. Agora, nos grupos de transição, de ciência e tecnologia, nós temos debatido profundamente a necessidade de construção do RMB, de ter recursos para o RMB. O país passa por um momento muito complicado, mas sinalizamos com uma série de formas de fazer isso acontecer. Uma delas, por exemplo, é conseguirmos descontingenciar o FNDCT [Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico]. Se conseguirmos liberar esses recursos, o RMB será um belo de um projeto ao longo do mandato do Presidente Lula.

Isso é uma das coisas que geram maior perspectiva. Temos trabalhado muito para isso. Nós estamos falando em US$ 500 milhões ao longo de cinco anos, que não fazem nem cosquinha no Orçamento, por exemplo, da Saúde, e nem no FNDCT. Acreditamos que vamos conseguir avançar com essa solução. Então, na área da medicina, o maior feito no ano de 2023 seria a liberação dos recursos para o Reator Multipropósito Brasileiro.

Fonte: Petronotícias