O Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) instalou recentemente um sistema de monitoramento IoT no contêiner laboratório na Usina Nuclear Angra 2, onde dois experimentos de neutrinos estão em operação: Neutrinos Angra e CONNIE (sigla, em inglês para Experimento de Interação Coerente Neutrino-Núcleo). O sistema IoT permite o monitoramento online do ambiente interno do laboratório, coletando dados que descrevem em tempo real o que está acontecendo, além de criar um histórico do comportamento climático do ambiente.
Os Experimentos
Neutrinos são partículas elementares difíceis de serem detectadas e estudadas. Podem ser produzidas pelo sol, a partir de radiação cósmica, mas também artificialmente por aceleradores e reatores nucleares. Os neutrinos de reatores nucleares são na verdade antineutrinos do elétron, um dos três tipos existentes. No Brasil, temos somente dois experimentos científicos voltados para a detecção de neutrinos de reatores, ambos instalados em um contêiner laboratório na Usina Nuclear de Angra 2, no estado do Rio de Janeiro. O experimento mais antigo – denominado Neutrinos Angra– utiliza o processo chamado Decaimento Beta Inverso para detectar o antineutrino em água com Gadolínio (0,2%), elemento químico do grupo das terras raras.
Usina Angra 2 com círculo vermelho destacando o laboratório contêiner onde o sistema IoT está instalado
Crédito: Herman Pessoa Lima Júnior (CBPF)
O Experimento Neutrinos Angra foi desenvolvido com o propósito de criar um detector de antineutrinos com capacidade de monitorar parâmetros relacionados à atividade de reatores nucleares, como a composição isotópica do combustível e a potência térmica instantânea liberada pelo reator. Essa aplicação de física de neutrinos está de acordo com os propósitos do programa da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) de desenvolvimento de novas técnicas para controle e aplicação de salvaguardas da não-proliferação de armas nucleares. O detector fica localizado em um contêiner, ao lado da cúpula de blindagem do reator de Angra 2.
O segundo experimento – CONNIE – formado por uma colaboração internacional, utiliza sensores científicos de imagem tipo CCD (Charge Coupled Devices) para detectar o antineutrino em Silício. Nesse caso, o processo físico é o chamado Espalhamento Coerente Neutrino-Núcleo, sendo que nenhum experimento ainda conseguiu detectar este processo na energia que CONNIE pode conseguir. Ambos os experimentos estão coletando dados continuamente há alguns anos dentro do contêiner laboratório posicionado a 30 m de distância do núcleo do reator de Angra 2, uma posição privilegiada em termos de quantidade de neutrinos proveniente do reator.
Monitoramento
Os experimentos ficam em operação tomando dados ininterruptamente e o interior do laboratório precisa ser monitorado também 24 horas por dia, fornecendo informações ambientais do interior do contêiner, como luminosidade, por exemplo. Como os pesquisadores envolvidos trabalham e residem em cidades distantes da usina, as variáveis monitoradas precisam ser enviadas periodicamente via rede de dados para o CBPF a fim do acompanhamento contínuo da situação no contêiner, garantido a segurança do laboratório e o bom andamento dos dois experimentos.
O projeto para monitoramento IoT foi elaborado em uma arquitetura de três camadas, composta por uma Camada de Nuvem, uma Camada de Borda e uma Camada de Dispositivos. Na Camada de Nuvem estão os servidores utilizados no CBPF, na Camada de processamento de Borda está o mini-computador Raspberry Pi e na Camada de Dispositivos está o dispositivo IoT. É possível acompanhar os dados coletados no interior do contêiner em tempo real a partir da tela do celular ou computador.
O sistema foi configurado para aquisição de dados dos sensores de temperatura, umidade, pressão atmosférica, luminosidade e presença. Também foi utilizado um GPS para sincronização da hora de forma automática, devido às restrições de segurança para o acesso à Internet dentro da Usina.
O equipamento foi projetado para ser flexível e facilmente adaptável de acordo com as necessidades de cada projeto ou laboratório onde for implantado. Sensores adicionais podem ser acrescentados para atender a novas demandas, atendendo às singularidades de cada ambiente.
Esse sistema foi desenvolvido pelo Laboratório de Informação e Instrumentação IoT (Lab3I) do CBPF ‒ especializado em Instrumentação IoT, espaço originalmente criado para atender projetos voltados à biblioteca, em temas como climatização da sala de obras raras e aplicativo de localização via bluetooth para exposições e localização de livros. Mas logo se identificou que suas aplicações têm alcance em diversas áreas da sociedade.
Gráficos de monitoramento de temperatura, umidade, pressão atmosférica e presença
Crédito: Alan Franco Rosa
Atualmente, a Colaboração Neutrinos Angra é composta por pesquisadores e estudantes de seis instituições brasileiras: CBPF – Rio de Janeiro-RJ, Universidade Estadual de Feira de Santana – Feira de Santana-BA, Universidade Estadual de Londrina – Londrina-PR, Universidade Federal da Bahia – Salvador-BA, Universidade Federal de Juiz de Fora – Juiz de Fora-MG e Universidade Estadual de Campinas – Campinas-SP.
No CBPF, participam os tecnologistas Herman Pessoa Lima Júnior e Nilton Alves Júnior, além do colaborador Alan Franco Rosa que defendeu este mês sua dissertação de Mestrado Profissional com o tema “Plataforma loT para monitoramento de laboratórios e experimentos”, diretamente relacionado ao seu trabalho com a colaboração.
Da esquerda para direita: Irina Nasteva (UFRJ), Gustavo Coelho (Eletronuclear), Alan Franco Rosa (CBPF), Herman Pessoa Lima Júnior (CBPF), Carla Bonifazi (UFRJ)
Crédito: Irina Nasteva (UFRJ)