Embora muito se fale sobre o assunto, o que falta exatamente para o Brasil apresentar o seu submarino de propulsão nuclear? Em entrevista à Sputnik Brasil, o diretor-presidente da Amazul explicou os detalhes e o andamento do projeto.
Trabalhar com tecnologia nuclear não é uma tarefa fácil, e alguns poucos países no mundo são capazes de dominar os ciclos tecnológicos que envolvem o uso de energia atômica. O Brasil planeja finalizar, nos próximos anos, o seu submarino convencional com propulsão nuclear (SCPN), do Programa de Desenvolvimento de Submarinos (Prosub), mas ainda há desafios que precisam ser vencidos.
Em entrevista à Sputnik Brasil, Newton de Almeida Costa Neto, diretor-presidente da Amazônia Azul Tecnologias de Defesa S.A. (Amazul), falou sobre o trabalho da estatal e garantiu que a principal missão da empresa neste momento é apoiar a construção do SCPN, “cuja finalidade é garantir a segurança nacional e a soberania brasileira no território marítimo”.
A Amazul é uma empresa pública criada pelo governo brasileiro com a atribuição de desenvolver tecnologias ao Programa Nuclear Brasileiro (PNB) e ao setor nuclear da Marinha. O nome da estatal faz referência à extensão marítima brasileira, que a própria Marinha do Brasil convencionou denominar Amazônia Azul. Ante a necessidade de finalizar o projeto do SCPN, acumulam-se problemas, como as dificuldades para comprar urânio enriquecido e as barreiras impostas para o uso da tecnologia por potências estrangeiras, em especial EUA e União Europeia.
Sobre esse assunto, Newton de Almeida Costa Neto explicou que os programas em que a empresa atua são estratégicos, complexos e de longo prazo, sendo que “os empreendimentos nucleares geralmente têm um período mais longo de maturação e desenvolvimento“. Ele apontou que o país já conseguiu dominar o ciclo do combustível nuclear, além de desenvolver e construir uma planta nuclear de geração de energia elétrica. Ainda assim, é preciso mais tempo até que o SCPN esteja pronto e em atuação.
“No momento os esforços estão concentrados, principalmente, na construção do reator nuclear que vai equipar o submarino convencional com propulsão nuclear. A cada ano, a Amazul vem assumindo mais responsabilidades no Laboratório de Geração Nucleoelétrica (Labgene), que é o protótipo, em terra, do sistema de propulsão do SCPN”, afirmou.
Ele apontou que, no ano passado, a estatal assinou contratos com empresas francesas para a prestação de serviços técnicos especializados para os projetos do prédio e sistemas pertencentes ao Labgene. Com isso, iniciou-se a fase de gestão compartilhada dos contratos com a Diretoria de Desenvolvimento Nuclear da Marinha.
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Além disso, a Amazul tem contratos com a Nuclebras Equipamentos Pesados S.A. (Nuclep), para a fabricação e montagem de estruturas que abrigarão o reator nuclear no Labgene, e com a Itaguaí Construções Navais (ICN), para a montagem de sistemas eletromecânicos. Com a Marinha, a Amazul fabrica ultracentrífugas destinadas ao enriquecimento de urânio, que é transformado em combustível nuclear pela Indústrias Nucleares do Brasil S.A. (INB) e enviado às usinas de Angra dos Reis.
Uma empresa com atuação além do Prosub
Segundo o diretor-presidente da estatal, apesar do destaque dado ao desenvolvimento dos submarinos, a atuação da Amazul vai muito além desses projetos.
“A empresa desenvolve tecnologias voltadas para garantir a soberania brasileira no território marítimo e proteger as imensas riquezas que ele abriga, melhorar a saúde e a qualidade de vida da população e proporcionar outros benefícios à sociedade.”
Os projetos e empreendimentos de que participa têm no escopo final a construção do SCPN, a geração de energia elétrica, a produção de radiofármacos, o desenvolvimento de um dispositivo de assistência ventricular e a conservação e proteção de alimentos, entre outros objetivos.
“Temos também o compromisso com a divulgação dos benefícios da tecnologia nuclear, para orientar as pessoas, combater mitos, preconceitos e, sobretudo, o enorme desconhecimento sobre a tecnologia nuclear”, disse Newton de Almeida Costa Neto.
Questionado sobre a importância de se continuar investindo no segmento de energia nuclear, o entrevistado relatou que o Brasil precisa “investir ainda mais na diversificação de sua matriz energética e na produção de energia limpa para enfrentar os grandes desafios do momento e do futuro“.
Segundo ele, diante do atual conflito na Ucrânia, que está provocando forte impacto no abastecimento de combustíveis na Europa e em outros países, ficou exposto o potencial da tecnologia nuclear como matriz de energia limpa e segura, “a custos competitivos e capaz de aumentar a independência energética dos países, inclusive do Brasil”.
“Além disso, a energia nuclear está alinhada às iniciativas de descarbonização do planeta, pois é uma fonte energética que não emite gás de efeito estufa. Por esses e outros motivos o governo federal tem tomado iniciativas para aumentar a participação da energia nuclear em nossa matriz. Acreditamos que os investimentos na energia nuclear devam aumentar nos próximos anos”, disse.
Em seguida, ele explicou que a empresa está capacitada para participar de várias fases de empreendimentos nucleares: desenvolvimento de projetos de engenharia, gestão de pessoas e do conhecimento; gerenciamento de contratos e de aquisições de produtos e serviços; e licenciamento, comissionamento e operação de instalações nucleares, entre outras.
Dessa forma, existe a expectativa de que a empresa participará ativamente do desenvolvimento do Centro Tecnológico Nuclear e Ambiental (Centena), que é uma solução sustentável para o armazenamento definitivo dos rejeitos de baixo e médio nível de radiação gerados em território nacional, e da instalação de centros de irradiação de alimentos, empreendimento que está sendo tratado com o Ministério da Agricultura, o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN) e a iniciativa privada, entre outros parceiros.
Fonte: Sputnik Brasil