Associações, empresas e especialistas concordam que uma nova usina nuclear no Brasil pode dar um impulso ao setor. O governo retomou o programa nuclear, estuda locais para implementação de novas usinas nucleares e recentemente aumentou a capacidade de enriquecimento de urânio.
No entanto, para a diretora-geral da Associação Nuclear Mundial, Sama Bilbao y Leon, o Brasil precisa antes terminar a construção de Angra 3 o mais rápido possível sob o risco de perder sua capacidade de construir usinas nucleares. Ela participou ontem do Latin America Investment Conference 2022, promovido pelo Credit Suisse.
Para a executiva, o Brasil é conhecido no mundo pela qualidade da indústria nuclear e a conclusão de Angra 3 é um passo fundamental para que o programa nuclear brasileiro possa ajudar no desenvolvimento da indústria nuclear nacional.
“Essa situação pode levar a uma certa erosão das capacidades internas e do ‘know how’ que o Brasil tinha em relação à construção de usinas nucleares. (…) Concluir Angra 3 significa revisar ou rever essas capacidades e será fundamental para pensar na construção da quarta usina nuclear”, afirmou.
No mesmo evento, o gestor de recursos na L2 Capital Partners, Marcelo López, disse que essa é uma oportunidade para o Brasil. Segundo ele, diversos países do mundo estão revendo seus programas, estendendo o uso de reatores nucleares e a previsão é que haverá um aumento de produção e no preço do urânio no mundo.
“Acredito que o preço do urânio vá subir. Foi um grande investimento para nós nos últimos anos, nosso fundo cresceu mais de 400% e há muito mais que pode ser feito.” López destaca o papel da fonte para descarbonizar a economia e “para o meio ambiente, a nuclear deve estar no topo da agenda”.
Contudo esse tipo de geração de energia sofre resistência e é alvo de controvérsia mundial há quase 70 anos, quando o presidente americano Eisenhower propôs, em discurso na ONU, o programa atômico pela paz.
O professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel), Nivalde de Castro, lembra que a decisão do Ministério de Minas e Energia (MME) sobre a construção de uma quarta usina faz parte da política energética brasileira firmada no Conselho Nacional de Planejamento Energético (CNPE) para diversificar a matriz “investindo em um tipo de geração que é o mais seguro, porque independe de intermitência e sazonalidade”.
Apesar de mais cara, Castro avalia que é uma energia segura. “Essa política de estado já tem um histórico do passado com o submarino nuclear, acordo com a Alemanha e graças a isso o Brasil desenvolveu uma competência tecnológica, uma cadeia produtiva”, diz o acadêmico.
Na visão do diretor técnico da consultoria PSR, Fernando Porrua, o Brasil possui muitas opções de tecnologias de baixo carbono que podem aportar uma expansão confiável e a nuclear é uma delas. Porém é a mais cara dentre todas as opções para o país. Para ele, é difícil justificar a compra uma tecnologia mais cara que a marginal para expandir o sistema.
“É justo o debate de que para o Brasil é importante ter o domínio da tecnologia, uma vez que temos a sexta maior reserva de urânio no mundo. Mas aí a discussão é de quem deveria pagar pelo custo deste domínio, que permite diversos usos, e acho que não deveria ser o setor elétrico.”
No entendimento do presidente da Associação Brasileira de Energia Nuclear (Aben), Carlos Mariz, uma nova usina vai exigir um grande aporte – em torno de US$ 5 bilhões em uma unidade de 1000 MW. No entanto, o investimento se justifica pela segurança energética. “A fonte nuclear gera muita energia, tem um fator de capacidade superior a 90% e, diferente de outras fontes renováveis, é uma energia firme e contínua.”
Mariz cita o Plano Nacional de Energia 2050 (PNE 2050), que estima uma expansão de 8 a 10 gigawatts (GW) na oferta de energia nuclear nos próximos 30 anos, e lembra a importância do Brasil no desenvolvimento desta fonte para o mundo. “Há 30 anos, a China veio ao Brasil aprender a fazer usinas nucleares. Hoje eles vão construir 150 usinas em 15 anos para substituir o carvão”, finaliza.
Fonte: Valor Econômico