O Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares anunciou que deixou de fabricar medicamentos usados para o diagnóstico e o tratamento de câncer por falta de dinheiro.
O que vai dentro dos carros mostrados na reportagem mexe com a vida de muitos brasileiros. Os veículos transportam radiofármacos. São substâncias usadas em exames de imagem, como cintilografias, e no tratamento de doenças como artrite e câncer. Elas emitem radiação. Por isso, o transporte tem que ser cuidadoso e rápido – a radioatividade dura poucos dias, não dá para guardar esses medicamentos num estoque.
O Ipen (Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares) produz 85% do que o Brasil usa dessas substâncias. Mas, por hora, essa desta segunda-feira (20) é a última grande remessa que sai de lá para hospitais e clínicas do país. Por falta de dinheiro, o Ipen não conseguiu mais comprar os insumos usados na produção.
Luis Antonio Genova, pesquisador do instituto e também diretor do Sindicato dos Servidores Públicos Federais de São Paulo, explica que a falta de recursos já era um problema anunciado.
“O Ipen sofreu um corte bastante severo no orçamento. Então desde o início do ano já se sabia que a situação ia chegar a esse ponto. Estão faltando mais de R$ 70 milhões para gente terminar o ano, ainda assim sem contar a valorização do dólar, porque tem muita parte assim que é importada”, diz.
Há menos de um mês, o governo federal enviou ao Congresso um projeto de lei para liberar crédito suplementar ao Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovações, ao qual o Ipen está subordinado. O texto ainda não foi votado.
Quando o Ipen receber mais recursos, não será de um dia para o outro que terá de volta os insumos importados e retomará a produção.
“Para importar não é um produto de prateleira. Tem que ter todo um planejamento, porque o outro país vai irradiar nos seus reatores nucleares. Então tem toda uma programação. Você não consegue reverter a situação de uma hora para outra. Durante esta semana, por exemplo, não produz mais nada”, afirma Luis Antonio.
A produção parada já está obrigando hospitais e clínicas a suspender exames e sessões de tratamento. O empresário Paulo Pinheiro operou um câncer na tireoide e tinha agendado uma primeira sessão de iodoterapia.
“O doutor acabou de me ligar dizendo que, infelizmente, por falta do medicamento, vai ter que ser reagendado e feita toda a programação novamente. Me senti frustrado, porque a gente quer tirar logo da frente, ainda mais se tratando de um câncer. A gente sabe que isso por ser um negócio que pode se expandir”, conta Paulo.
O diretor da Sociedade Brasileira de Medicina Nuclear lembra que os radiofármacos são vitais para pessoas com câncer. A entidade estima que até 2 milhões de pacientes possam ser afetados.
“Eu não sei o que falar para esses pacientes. É tão ruim falar para eles que o tratamento não vai poder ser realizado porque a medicação está em falta. Quem que vai pagar esse preço? Esse paciente tem um câncer, que se não for tratado pode progredir, pode levar até a morte, e quem vai responder por isso? É uma situação muito dramática”, diz o médico nuclear Dalton Alexandre dos Anjos, diretor da Sociedade Brasileira de Medicina Nuclear.
O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações afirmou que, desde junho, tem pedido ao Ministério da Economia mais recursos para a produção dos medicamentos. O Ministério da Economia declarou que o governo federal enviou ao Congresso um projeto de lei para dar mais verbas ao Ipen e que, por lei, não pode aumentar os recursos por conta própria.
Assista a reportagem do Jornal Nacional
Fonte: G1